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Contos, Lendas e Poesia

Contos, Lendas e Poesia

29
Jul06

Velhas Árvores

contoselendas

Olha estas velhas árvores, mais belas
Do que as árvores novas, mais amigas:
Tanto mais belas quanto mais antigas,
Vencedoras da idade e das procelas...

O homem, a fera, e o inseto, à sombra delas
Vivem, livres de fomes e fadigas;
E em seus galhos abrigam-se as cantigas
E os amores das aves tagarelas.

Não choremos, amigo, a mocidade!
Envelheçamos rindo! envelheçamos
Como as árvores fortes envelhecem:

Na glória da alegria e da bondade,
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem!


Olavo Bilac

28
Jul06

Os amantes com casa

contoselendas

Andavam pela casa amando-se

no chão e contra as paredes.

Respiravam exaustos como se tivessem

nascido da terra

de dentro das sementeiras.

Beijavam-se magoados

até se magoarem mais.

Um no outro eram prisioneiros um do outro

e livres libertavam-se

para a vida e para o amor.

Vivendo a própria morte

voltavam a andar pela casa amando-se

no chão e contra as paredes.

Então era música, como se

cada corpo atravessasse o outro corpo

e recebesse dele nova presença, agora

serena e mais pobre mas avidamente rica

por essa pobreza.

A nudez corria-lhes pelas mãos

e chegava aonde tudo é branco e firme.

Aquele fogo de carne

era a carne do amor,

era o fogo do amor,

o fogo de arder amando-se e por toda a casa,

contra as paredes,

no chão.

Se mais não pressentissem bastaria

aquela linguagem de falar tocando-se

como dormem as aves.

E os olhos gastos

por amor de olhar,

por olhar o amor.

E no chão

contra as paredes se amaram e

pela casa andavam como

se dentro das sementeiras respirassem.

Prisioneiros libertados, um

no outro eram livres

e para a vida e para o amor se beijaram

magoando-se mais, até

ficarem magoados.

E uma presença rica,

agora nova e mais serena,

avidamente recebeu a música que atravessou de

um corpo a outro corpo

chegando às mãos

onde toda a nudez é branca e firme.

Com uma carne de fogo,

incarnando o amor,

incarnando o fogo,

contra o chão das paredes se amaram

pressentindo que

andando pela casa bastaria tocarem-se

para ficarem dormindo

como acordam as aves.

 

Joaquim Pessoa

 

28
Jul06

Palestra

contoselendas

            Conta-se que um palestrante muito famoso ganhava muito dinheiro como "expert" em educação infantil, sobretudo com sua palestra intitulada "Os 10 Mandamentos para os Pais bem sucedidos na Ciência do bem educar seus filhos"... Era sobre dez "Leis" que todo pai e toda mãe deveriam seguir inexoravelmente. Dizia a todos como se comportarem diante do desafio de serem pais. Tinha resposta para tudo e todos, porém era solteiro e sem filhos. Certo dia, conheceu a Mulher de seus sonhos. Apaixonaram-se e casaram-se em seguida. Um ano depois, o casal foi abençoado com seu primeiro filho. Não passou muito tempo e diante de uma nova realidade ele percebeu que sua Palestra melhor seria chamada de "As 10 Regras de Ouro indicadas para os Pais que desejassem ser bem sucedidos na Ciência do bem criar seus Filhos". No ano seguinte, o casal teve mais um filho, e diante das novas dificuldades e desafios que surgiram, o palestrante refez sua Palestra, passando chama-la de "As 10 Sugestões para os Pais bem sucedidos na Arte de criar seus Filhos". Mais um ano e mais um filho. Não muito tempo depois do nascimento de seu terceiro filho, o palestrante mais uma vez se viu obrigado a rever sua Palestra, a qual passou a ser apresentada com o título de "Tentativas para se criar os filhos nos dias de hoje". Após o nascimento do quarto filho, o Palestrante mudou de profissão.

27
Jul06

Dez Réis de esperança

contoselendas

Se não fosse esta certeza
que nem sei de onde vem,
não comia, nem bebia,
nem falava com ninguém.
Acocorava-me a um canto,
no mais escuro que houvesse,
punha os joelhos à boca
e viesse o que viesse.

 

Não fossem os olhos grandes
do ingénuo adolescente,
a chuva das pernas brancas
a cair impertinente,
aquele incógnito rosto,
pintado em tons de aguarela,
que sonha no frio encosto
da vidraça da janela,
não fosse a imensa piedade
dos homens que não cresceram,
que ouviram, viram, ouviram,
viram, e não perceberam,
essas máscaras selectas,
antologia do espanto,
flores sem caule flutuando
no pranto do desencanto,
se não fosse a fome e a sede
dessa humanidade exangue,
roía as unhas e os dedos
até os fazer em sangue.

 

António Gedeão

27
Jul06

Quanto de Ti Amor

contoselendas

Quanto de ti amor. Me possui no abraço
Em que de penetrar-te me senti perdido
No ter-te para sempre-
Quanto de Ter-te me possui em tudo
O que eu deseje ou veja não pensando em ti
No a braço a que me entrego-
Quanto de entrega é como um rosto aberto,
Sem olhos e sem boca, só expressão dorida
De quem é como a morte-
Quanto de morte recebi de ti,
Na pura perda de possuir-te em vão
De amor que nos traiu-
Quanta traição existe de possuir-se a gente
Sem conhecer que o corpo não conhece
Mais que o sentir-se noutro-
Quanto sentir-te e me sentires não foi
Senão o encontro eterno que nenhuma imagem
Jamais separará-
Quanto de separados viveremos noutros
Esse momento que nos mata para
Quem não nos seja e só-
Quanto de solidão é este estar-se em tudo
Como na ausência indestrutível que
Nos faz ser um no outro-
Quanto de vida consumimos pura
No horror e na miséria de, possuindo, sermos
A terra que outros pisam-
Oh meu amor, de ti,
por ti, e para ti,
Recebo gratamente como se recebe
Não a morte ou a vida, mas a descoberta
De nada haver onde um de nós não esteja

 

Jorge de Sena
26
Jul06

Apelo

contoselendas

Porque não vens agora, que te quero
E adias esta urgência?
Prometes-me o futuro e eu desespero
O futuro é o disfarce da impotência...

Hoje, aqui, já, neste momento,
Ou nunca mais.
A sombra do alento é o desalento
O desejo o imite dos mortais.

 

Miguel Torga

24
Jul06

"Atiro a porta mãe?"

contoselendas

Vivia um menino pobre, com sua mãe, nas últimas casas de uma aldeia.
A mãe ia trabalhar, todos os dias, deixando o menino sozinho. Antes de sair recomendava-lhe:

- Não abras a porta a ninguém, nem mostres as nossas verónicas!

O menino respondia-lhe que fosse descansada, porque ele faria conforme ela lhe estava a recomendar.

Mas, certo dia, uns homens, que pareciam boas pessoas bateram à porta e perguntaram ao rapazinho se lá em casa haveria alguma coisa bonita que ele lhes pudesse mostrar.

O menino correu a buscar as verónicas, que a mãe guardava na cómoda do quarto. Os ladrões – porque era isso que eles eram – pegando no saco, imediatamente se foram embora.

Pouco depois, chegou a mãe. O menino estava triste e confessou-lhe o que se tinha passado. A pobre mulher, vendo-se sem o seu tesouro, lançou mãos à cabeça e começou a correr estrada abaixo, pelo caminho que os ladrões tinham seguido.

Entretanto, gritava para o menino que a queria acompanhar:

Fecha a po…o…orta…!!!

Levo a porta, mãe…e…e? – respondia-lhe o menino.

Fecha a po…o…o…orta…!!!

Levo a porta, mãe…e…e?

Sem entender o que a mãe lhe gritava, cada vez mais distante dele, levantou a porta e começou a correr, com ela às costas, ao encontro da sua mãe.

Já muito longe de casa, muito cansados e sem verem o caminho, porque, entretanto, o sol já se tinha posto, mãe e filho resolveram passar a noite em cima de uma azinheira, carregando, também, a porta.

A altas horas, sentem passos… conversas… por entre as árvores do montado. E, qual não foi o seu espanto quando, precisamente debaixo da árvore em que eles estavam, se vieram sentar, discutindo, dois homens carregados de sacos e outros objectos. Eram os ladrões, que se preparavam para dividir, entre si, o que tinham roubado.

Então começaram:

Pataca a ti... pataca a mim…
Pataca a ti... pataca a mim…

A mulherzinha e o filho, em cima da árvore, nem respiravam. A criança na sua imprudência, murmurava à mãe:

Atiro a porta, mãe?

A mãe, com um gesto, tapava-lhe os lábios, gelada de medo. O menino continuava:

Atiro a porta, mãe?

E atirou!

Os ladrões, pensando que era o céu que lhes caía em cima, puseram-se em fuga e não mais voltaram.

Foi assim que mãe e filho puderam recuperar não só as suas verónicas, como também, ganhar muitas outras riquezas que os ladrões abandonaram no chão, debaixo da azinheira.

 

Nota:" verónica" – moeda em oiro (segundo Filinto, VII, 228) in "Dicionário de Língua Portuguesa" de Cândido de Figueiredo.

Este conto popular deve ser muito antigo e pouco conhecido, porque só o ouvi contar a uma pessoa de muita idade. Pelas circunstâncias e pela palavra "verónica" denota ser muito antigo.

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